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Poetisa Maria Rosário de Fátima Pinto – Síntese biográfica

Maranhense de Bacabal, a cordelista Maria Rosário de Fátima Pinto é graduada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ) e especialista em literatura de cordel.

Rosário Pinto ingressou na Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC) em 2001, ocupando a cadeira 18 cujo patrono é José Bernardo da Silva.

Como responsável pelo significativo acervo de cordel da Biblioteca Amadeu Amaral, do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP), construiu-se a compreensão de que o trabalho com tão rico acervo fez a poeta, mas Cláudia Marcia Ferreira, diretora do CNFCP, ao escrever a apresentação do primeiro folheto de Rosário, Catalogação de Cordel (2012), amplia este alicerce ao afirmar que: “Rosário traz na bagagem maranhense o gosto e o respeito pela narrativa oral.” A própria cordelista, na contracapa do seu terceiro folheto, intitulado Nas Asas do Pavão Misterioso: 90 anos de sucesso (2012), compartilha circunstâncias da vida que também forjaram sua verve poética:

A literatura popular me acompanha desde criança na figura de meu pai, leitor voraz de Zé da Luz, Catullo da Paixão Cearense, dentre tantos outros. Hoje me sinto à vontade para exibir meus versos e, certamente aberta às intervenções dos demais poetas, por quem criei afeto e admiração. A eles, agradeço o estímulo que tenho recebido.

O poeta popular Arievaldo Viana ao se reportar à acadêmica Rosário Pinto, exprimiu:

[…] de tanto lidar com folhetos acabou absorvendo a técnica e a inspiração própria dos poetas populares e vem despontando também como poeta. Ela dá sequência a uma tradição iniciada por Maria das Neves Pimentel, filha do poeta e editor Chagas Batista, reconhecidamente a primeira mulher a publicar folhetos de cordel. (PINTO, 2012)

Rosário Pinto teve a sua primeira produção cordelística classificada em 28º lugar no Prêmio Mais Cultura de 2011, Edital Patativa do Assaré:

CATALOGAÇÃO DE CORDEL
 
Caros amigos leitores
Venho aqui para explicar
Neste trabalho exaustivo
De quem vive a pesquisar
A maneira mais correta
De cordel, catalogar
 
Mas com verso de cordel
Há que ter muito cuidado
Se o cabra não for bom
Vai ficar atrapalhado
Escrever muita besteira
Ficar desarticulado
 
No Centro Nacional
De Cultura Popular
Acervo de cordel é
Referência singular
Poeta de toda parte
Vem aqui depositar
 
Seus folhetos de cordel
Para conosco gravar
A memória permanente
Da cultura popular
A Cordelteca respalda
A poesia popular
 
Em cordel, na informática
Da Amadeu Amaral
Dentro de nosso sistema
Código é dado especial
Local, então, nem se fala
É coisa fundamental
 
Nosso registro é fiel
A polêmica é autoral
O acróstico identifica
Título é fundamental
Cada qual dando notícia
Da história universal
 
[...]
(PINTO, 2012)

Autora de uma nova prática discursiva no domínio da poesia popular, com sua amiga cordelista, a também acadêmica da ABLC, Dalinha Catunda, desenvolveu uma peleja virtual intitulada Fuxico de Mulher (2011).

No espaço cibernético, Rosário coordena, junto com Dalinha, um blog orientado à cultura popular, Cordel de Saia. Rosário Pinto também mantém um blog pessoal, onde expõe suas produções, como o poema dedicado à árvore símbolo do Brasil: 

A BIODIVERSIDADE DOS IPÊS
 
O Ipê tem várias cores
Ilustrando seu encanto,
Com ele me emociono
Sua beleza, eu garanto,
É de pura poesia.
Traz sempre a alegria
Inspirando nosso canto
 
Os amarelos são fortuna
Não apenas de valor
Mas de algo mais profundo
Muito mais encantador
São aqueles que iluminam
E também que nos fascinam
Repletos de tanta flor
 
A cor rosa é primavera
Bela como uma aquarela
Das mulheres de Outubro
Que não caem em esparrela
Que cuidam de suas vidas
São guerreiras aguerridas
Fita rosa na lapela.
 
O branco nos traz a paz
O que todos precisamos
O ar puro que respiras
Transcendentes de seus ramos
Paz, harmonia e beleza.
Tem na flor toda a pureza
É o ar que respiramos.
 
Existem multicolores
São de flores germinadas.
Vindos de um mesmo ramo
Cores diversificadas.
Permanecem muito unidos
Bordados, juntos, cerzidos
Como gêmeos, bem grudados.
(PINTO, 2017)

FONTES CONSULTADAS

PINTO, Rosário. A biodiversidade dos ipês. [S.l : s.n.]. In: Rosário Pinto. 2 out. 2017. Disponível em: <http://rosarioecordel.blogspot.com.br/&gt;. Acesso em: 23 out. 2017.

PINTO, Maria Rosário. Catalogação de cordel. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Literatura de Cordel, 2012. 16p.

Poetisa Maria Izabel Tenório de Albuquerque – Síntese biográfica

A cordelista pernambucana Maria Izabel Tenório de Albuquerque nasceu em Pedra (PE) no dia 05 de novembro de 1961. Em 2008, adotou o nome artístico de Bel Salviano, mas é chamada pelos amigos de Poetisa do Sertão e por meio de um poema biográfico publicado no Recanto das Letras assim apresenta seu perfil:

Pra quem não me conhece
Canto aqui minha riqueza
M’alma tem cheiro de flor
Sou filha da natureza
Na idade do pecado
Expresso só a beleza.
 
Sou a flor de mandacaru
Da terra seca o meu chão
Escrevo a minha vida
Tiro d’alma ao coração
Sou da lua iluminada
Vim do Portal do Sertão
 
Sou semente da terra
Sereia lá do teu mar
Sou gata borralheira
Vivo no mundo a sonhar
Sou guerreira na poesia
Estrela do céu a brilhar
 
Sou pássaro de gaiola
Pra voar não tem direção
Sou lá do pé de serra
Sou da genética do baião
Eu sou Bel Salviano
A poeta d’uma canção!
(BEL …, [20--]b)

Bel Salviano desenvolveu a sua veia literária por meio de escritos epistolares, ainda criança, incitando o seu estilo próprio de poesia livre (BEL …, [20–]a).Criou a associação Planeta Poeta Cultura Nordestina com o objetivo de resgatar as raízes da cultura popular nordestina, anunciando não só artistas anônimos (poetas, cordelistas, cantadores, emboladores, compositores, cantores, etc.), como os expoentes da cultura nordestina (BEL …, [20–]a). O trabalho na promoção do cordel também se dá por meio do projeto oficina de cordel nas escolas e praças públicas, intitulado Voluntários da Poesia. (BEL …, [20–]a).

Em correspondência a Luiz Berto Silva, autor do blog Jornal da Besta Fubana: uma gazeta da bixiga lixa, Bel Salviano assegura que “[…] alguns dizem que sou cordelista, outros me chamam de poetisa, mas o que gosto mesmo é de divulgar a cultura nordestina […]” (SALVIANO, 2012). Sem dúvida nenhuma, seus projetos afiançam seu esforço na divulgação da cultura nordestina, mas a afirmação de Bel Salviano é modesta demais em relação às suas produções cordelistas, como exemplo do poema popular Cordelistas da Nação J. Ferreira

No cordel J. Ferreira
Narra à vida na roça
Tempo doce que adoça
A vida corriqueira
Da nação brasileira
Na volta ao passado
Pra viver conformado
Na estadia do seu avô
Hoje lembrado com amor
Na poesia tão aclamado
 
Com grandeza agricultor
Por nosso Deus exaltado
Pelo neto adorado
Cultivou a terra com amor
Com o gás do beija-flor
Hoje é vida na poesia
Na rima com maestria
Seu neto J. Ferreira
Faz cordel de primeira
Da roça herdou a magia.
[...]
(SALVIANO, 2009)

Em parceria com Jerson Brito, escreveu a Cartilha do Cordel

Se você quer aprender
A fazer um bom cordel
Pegue lápis ou caneta
E anote no papel
É bem fácil, meu amigo
E gostoso feito mel
 
Escreva primeiro, aí
Para não ficar perdido
Que o verso é cada linha
Do cordel que é construído
Cada grupo de versinhos
Por estrofe é conhecido
 
Agora, vamos dizer
Como as sílabas contamos
É um pouco diferente
Daquilo que estudamos
Contagem gramatical
Nem sempre consideramos
 
O cordel é exigente
E prima pela estética
Acima foi mencionada
A tal sílaba poética
Pro estilo é requerida
Está em sua genética
(SALVIANO; BRITO, 2011)

FONTES CONSULTADAS

BEL Salviano. In: Portal pernambuco nação cultural. Jaboatão dos Guararapes (PE) : [s.n.], [20–]a. Disponível em: <http://www.nacaocultural.com.br/belsalviano1&gt;. Acesso em: 19 abr. 2017.

BEL Salviano: perfil. In: Recanto das letras. [S.l. : s.n.], [20–]b. Disponível em: <http://www.recantodasletras.com.br/autor.php?id=59560&gt;. Acesso em: 19 abr. 2017.

SALVIANO , Bel. Bel Salviano: Jaboatão dos Guararapes (PE). In: Jornal da Besta Fubana: uma gazeta da bexiga lixa. 16 jul. 2012. Disponível em: <http://www.luizberto.com/correspondencia-recebida/bel-salviano-%E2%80%93-jaboatao-dos-guararapes-%E2%80%93-pe&gt;. Acesso em: 20 abr. 2017.

SALVIANO, Bel; BRITO, Jerson. Cartilha do cordel. In: Pantera cordelaria. [S.l. : s.n.], 1 fev. 2011. Disponível em: <http://panteracordelaria.blogspot.com.br/2011/02/cartilha-do-cordel-bel-salviano-e.html&gt;.  Acesso em: 20 abr. 2017.

SALVIANO, Bel. Cordelista da nação J. Ferreira. In: Recanto das Letras. [S.l. : s.n.], 16 ago. 2009. Disponível em: <http://www.recantodasletras.com.br/cordel/1756755&gt;. Acesso em: 20 abr. 2017.

Poetisa Maria do Rosário Lustosa da Cruz – Síntese biográfica

A cordelista Maria do Rosário Lustosa da Cruz é natural da Capital da Fé, pois nasceu em Juazeiro do Norte (CE) no dia 2 de novembro de 1953 (CRUZ, 2008; MARIA…, [21–]). Desde criança esteve às voltas em performances artísticas, no rádio, cinema e teatro, como quando ainda menina cantava em programa de calouro da Rádio Iracema; jovem, participou do filme biográfico Padre Cícero: os milagres de Juazeiro, que foi lançado em 1976 e foi membro do Grupo Teatral Willian Shakespeare, participando da 1ª Bienal de Artes de Juazeiro do Norte, com a peça teatral, Soraia, Posto 2, de Pedro Bloc. (MARIA…, [21–]).

Tendo a literatura como parte integrante em sua vida, foi aos 39 anos que Maria do Rosário começou a aventurar-se como cordelista e, oito anos depois (2000), passou dedicar-se inteiramente a arte da literatura popular, tendo sido partícipe do Projeto Letras Vivas da Lira Nordestina (2005), com objetivo de resignificar a memória e a produção da literatura de cordel (MARIA…, [21–]).

Para fortalecer a cultura regional trabalhou, em 2011, com o professor Renato Dantas, no projeto da publicação dos 100 cordéis dos 100 Anos de Juazeiro do Norte, patrocinado pelo Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB), publicando 100 Anos de Juazeiro Registrados no Cordel. Em 2014 lançou Tempo de Saudade no embalo do cordel e no ano seguinte Crato na Literatura de Cordel (MARIA…, [21–]).

Rosário teve seu primeiro cordel publicado no Projeto SESCordel Novos Talentos. Como poetisa cordelista é artesã das palavras, habilidade também desenvolvida como Griô, cujo produto artístico é a história narrada. Rosário é Griô em projeto da Universidade Regional do Cariri (URCA), pela Lira Nordestina, por meio do Ministério da Cultura (MINC). (CRUZ, 2008; MARIA…, [21–]).

Há 15 anos Maria do Rosário é membro do Instituto Cultural do Vale Caririense (ICVC), tendo ingressado em dezembro de 2001, onde ocupa a cadeira de nº 3; na Academia dos Cordelistas da Cidade do Crato (ACC) ocupa a cadeira de nº 8 desde setembro de 2003; em 2014 ingressou no Instituto Cultural do Cariri (ICC) ocupando a cadeira 39 e na Academia de Xilógrafos e Cordelistas do Cariri, para cadeira 10 e também compõe a Associação dos Poetas de Barbalha (APB) desde 2011 (CRUZ, 2008; CRUZ, 2011; MARIA…, [21–]).

Maria do Rosário é pedagoga (2003) e assistente social (2014) com pós-graduação em Língua Portuguesa e Arte Educação, com pesquisa em Literatura de Cordel (2005). (MARIA…, [21–]). Renato Casimiro ao apresentar a cordelista no folheto Histórias dos De-Comê lá de nós afirma que Maria do Rosário “não escolhe tema para seu versejar. É habilidosa e incorpora sem sofisticação o linguajar dos sertões para falar de suas belezas”. (ROSÁRIO, 2010)

Histórias dos "De-Comê lá de nós"
 
Este cordel que agora
aqui eu vou começar
é sobre a gastronomia
que muito jpa ouvi falar
é pra você que nem eu
também possa se interessar.
 
Nossa terra tudo dá
pela riqueza do chão
tem identidade própria
que já virou tradição
mesclada por seus sabores
transmitida em geração.
 
Do índio veio a cultura
do milho e da mendioca
com o primeiro faz cuscuz
faz o angu e a pipoca
do segundo o beiju
farinha e a tapioca.
 
A carne do boi é a mais
gosotsa e preferida
faz boa manta de charque
podendo comer moída
para o bife e o churrasco
é sempre uma boa pedida.
 
(ROSÁRIO, 2010)

FONTES CONSULTADAS

CRUZ, Maria do Rosário Lustosa da Cruz. Machado de Assis: o leitor e escritor do Brasil. [S.n.]: Juazeiro do Norte, 2008.

CRUZ, Maria do Rosário Lustosa da Cruz. Poeta Pedro Bandeira: setenta anos de vida pra poesia. [S.n.]: Juazeiro do Norte, 2011.

MARIA DO ROSÁRIO LUSTOSA DA CRUZ. In: Academia de Letras do Brasil – Ceará. [21–]. Disponível em: <http://academiadeletrasdobrasilceara.blogspot.com.br/2015/10/maria-do-rosario-lustosa-da-cruz.html&gt;. Acesso em: 12 out. 2017.

ROSÁRIO, Maria do. Histórias dos De-Comê Lá de Nóis. [S.n.]: Crato, 2010.

Poetisa Maria de Lourdes Aragão Catunda – Síntese biográfica

A cearense Maria de Lourdes Aragão Catunda, mais conhecida como Dalinha Catunda, filha de Espedito Catunda de Pinho e Maria Neuza Catunda, é uma cordelista, declamadora e contadora de histórias. Traz no sangue o dom artístico, pois a mãe era poetisa e a tia contadora de histórias. Natural de Ipueiras (CE), nasceu no dia 28 de outubro de 1952 e radicou-se, ainda jovem, no Rio de Janeiro (MAGALHÃES, [21–]; OLIVEIRA; SOARES, 2016).

Desde cedo aprendeu a transformar sentimentos em versos e prosas, e ao produzir trabalhos de reconhecido valor literário cultural, Dalinha Catunda conquistou espaço hegemonicamente masculino da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), ocupando a cadeira 25 cujo patrono é Juvenal Galeno. Também é membro da Academia Ipuense de Letras, Ciência e Artes (AILCA) e sócia benemérita da Academia dos Cordelistas do Crato (ACC) (MAGALHÃES, [21–]; OLIVEIRA; SOARES, 2016).

No blog Cordel de Saia, Dalinha propôs o mote: Se tem mulher no cordel/Você tem que respeitar. E na primeira estrofe, versou:

MULHER NO CORDEL
 
O homem é mestre no verso
E a mulher nunca se acanha
Rodando a saia com manha
Ingressa nesse universo
Encara tema diverso
Na cultura popular,
Ocupando seu lugar
E faz bem o seu papel
Se tem mulher no cordel
Você tem que respeitar.
(CATUNDA et. al., 2012)

Segundo Magalhães ([21–]), Dalinha planejou e fundou o grupo Flor do Cariri, no Crato (CE), e assim ressignificou a contação de história e cantigas de roda, traços da sua infância e formadores de sua identidade nordestina.

Por meio de sua verve poética, apresenta autorrelato de suas origens, unindo sua vida à sua inserção histórica e sociocultural. A poesia biográfica de um tempo vivido fortalece a identidade. Vamos apreciar os poemas Filha do Nordeste e Nordestina, sim senhor! e descobrirmos um pouco dessa poetisa popular.

Filha do Nordeste
 
Sou Dalinha, sou da lida.
Sou cria do meu Sertão.
Devota de São Francisco
E de Padre Cícero Romão.
 
Sou rês da Macambira,
Difícil de ir ao chão.
Sou o brotar das caatingas,
Quando chove no sertão.
 
Sou cacimba de água doce,
Jorrando em pleno verão.
Sou o sol quente do agreste.
Sou o luar do sertão.
 
Minha árvore é mandacaru.
Meu peixe, curimatã.
Eu tomo com tapioca,
O meu café da manhã.
 
Sou uma bichinha da peste,
Meu ídolo é Lampião.
Sou filha das Ipueiras.
Sou de forró e baião.
 
Sou rapadura docinha,
Mas mole eu não sou não.
Sou abelha que faz mel,
Sem esquecer o ferrão.
 
E se alguém realmente,
Inda perguntar quem sou,
Digo sem medo de errar:
Sertaneja, Sim Senhor!
 
Nordestina, sim senhor!
 
Eu sou nordestina
Me orgulho de ser
Sou do Ceará
Com muito prazer
Não faço suspense
Sou ipueirense
Pra quem quer saber.
 
Se escuto a sanfona
Perfumo o cangote
Dançando faceira
Aguento o pinote
Pois sou dançadeira
Levanto a poeira
Capricho no xote.
 
Eu danço São João
Eu pulo fogueira
Faço simpatia
A da bananeira
Me visto de chita
Com laço de fita
Desfilo faceira.
 
Eu como cuscuz
Paçoca e baião
Como tapioca
E bife do oião
Eu como buchada
Também malassada
Sem indigestão.
 
Na rede me deito
Pra me balançar
E nesse balanço
Preciso contar
Cumprindo o destino
Eu já fiz menino
Sem punhos quebrar.
 
Eu sou ribaçã
Sou ave migrante
Sou rio que corre
Que segue adiante
Eu sou empolgada
Comigo só nada
É quem se garante.
 
Eu sou mesmo agreste
Meu nome é Dalinha
Não fujo de embate
Não fujo da rinha
Se você empaca
Não puxe sua faca
Deixe na bainha.

Dalinha passou a escrever cordéis quando começou a residir no Rio de Janeiro, como forma salvaguardar sua identidade nordestina, como afirmou em entrevista: “O cordel propriamente dito, eu só comecei a fazer aqui no Rio e passei também a escrever mais, por conta da saudade que eu sentia do mundo que deixei para trás”. Tal afirmação demonstra sua paixão pela cultura popular e sua origem, por isso trabalha para manter viva a cultura cordelística.

Antes de concluir, não podemos deixar de apresentar como a cordelista Dalinha é vista pelos olhos da parceira de produção poética Maria do Rosário Pinto:

[…] Sua temática é sempre corajosa, carregada de humor e com rimas impecáveis. Sua criatividade/atividade é intensa, explode ao menor sinal. Basta cutucá-la com um tema qualquer, que logo começa um novo poema. […] nos mostra o que mais a caracteriza poeticamente – versatilidade na criação temática, na arte da composição, da rima e da estruturação das orações. (CATUNDA, 2010)

Eternizada no folheto de Josenir Amorim Alves de Lacerda, Dalinha Catunda: a abelha do sertão.

Vieram me pergunta
quem é mesmo essa Dalinha
que tão faceira caminha
sem no verso tropeçar
que sabe tão bem falar
com carinho e precisão
das belezas do sertão
empolgada e sem preguiça
nossa saudade ela atiça
no forno do coração.
 
Essa "cabôca" sem par
responde sem ter receio
é daqui do nosso meio
digo sem medo de errar
da cultura popular
é ferrenha protetora
é mestre e divulgadora
enaltece o seu valor
com zelo e com destemor
do cordel é defensora
[…]
 
(LACERDA, 2011)

Com sua literatura de cordel, Dalinha já versou com vários poetas populares, como Dideus Sales, Francisco Itaerço, Fred Monteiro, Josenir Lacerda, Luiz de Assis Monteiro, Marco Di Aurélio e Rosário Pinto.

FONTES CONSULTADAS

CATUNDA et. al. Mulher no cordel I. [S.l. : s.n.] In: Cordel de saia. 27 set. 2012. Disponível em: <http://cordeldesaia.blogspot.com.br/2012/09/mulher-no-cordel.html&gt;. Acesso em: 23 out. 2017.

CATUNDA, Dalinha. Cobra criada. Rio de Janeiro: ABLC, 2010.

LACERDA, Josenir. Dalinha Catunda: a abelha do sertão. Crato: Academia dos Cordéis de Crato, 2011.

MAGALHÃES, Elton Linton O. Personalidades. [S.l. :s.n.]. In: Cordel na web.   [21–]. Disponível em: <https://ocordelnaweb.wordpress.com/entrevistas-2/&gt;. Acesso em: 22 out. 2017.

OLIVEIRA, Ana Aparecida Alves Pereira; SOARES, Maria Clara Pereira. Cordelistas no processo migratório: a expressão da experiência feminina e nordestina. Ponto e Vírgula, São Paulo, v. 20, p. 83-103, segundo semestre 2016.

Poetisa Maria Alda Oliveira – Síntese biográfica

A cordelista Maria Alda Oliveira, autora do livro Ao Sanfoneiro Dominguinhos, lançado no XV Festival de Violeiros do SESC Iguatu (2013), com o apoio do projeto SESC-Cordel, na solenidade de lançamento, declamou:

Esta semente brotada
do sertão de Garanhuns
como ele, mais alguns
filhos desta Pátria Amada
uma joia garimpada
logo ao amanhecer
da vida, soube escolher
o que não havia enganos
bem pequeno aos doze anos
cantou, tocou pra valer.
(ALDA …, 2013)

Natural de Iguatu (CE), Maria Alda possui o título de embaixatriz do Parque Cultural Rei do Baião, memorial do cantor e sanfoneiro Luiz Gonzaga, localizado em São João do Rio do Peixe (PB). O Parque é destinado a encontros de fãs e intérpretes do Rei do Baião, onde ocorre, anualmente, o Festival de Músicas Gonzaguianas. No espaço também ocorre o Concurso de Poesia em Homenagem ao Gonzagão (CONPOZAGÃO) que já teve a cordelista Alda como participante (ARAÚJO, 2017; CARDOSO, 2013; ENTREVISTA …, 2013).

Em entrevista ao Caldeirão Político (2013), Alda Oliveira explicou o que Luiz Gonzaga significa para ela: “[…] os repentistas, as nossas riquezas, a seca, a estrada do retirante, além da voz de protesto denunciando as injustiças e o abandono do Nordeste. […]” (ENTREVISTA…, 2013).

FONTES CONSULTADAS

ALDA homenageia Dominguinhos. [S.l.: s.n]. In: Caldeirão político: 38 anos. 14 nov. 2013. Disponível em: <http://www.caldeiraodochico.com.br/alda-homenageia-dominguinhos/&gt;. Acesso em: 07 set. 2017.

ARAÚJO, Egnaldo Peixoto de. Um parque para o rei [S.l. : s.n.]. In: Parque Cultural O Rei do Baião: o espaço dos gonzaguianos. 9 mar. 2017. Disponível em: <http://gonzagaodobrasil.blogspot.com.br/?m=0&gt;. Acesso em: 7 set. 2017.

CARDOSO, Francisco Alves. Chora sanfona! [S.l. : s.n.]. In: Caldeirão político: 38 anos. 24 jul. 2013. Disponível em: <http://www.caldeiraodochico.com.br/chora-sanfona/&gt;. Acesso em: 7 set. 2017.

ENTREVISTA sobre vida e obra de Luiz Gonzaga com a escritora e cordelista Maria Alda Oliveira, da cidade de Iguatu, Estado do Ceará. [S.l. : s.n.]. In: Caldeirão político: 38 anos. 12 jul. 2013. Disponível em: <http://www.caldeiraodochico.com.br/entrevista-sobre-vida-e-obra-de-luiz-gonzaga/&gt;. Acesso em: 7 set. 2017.

Poeta Joviano dos Santos – Síntese biográfica

Poeta cordelista, repentista, declamador regionalista, Joviniano dos Santos, mais conhecido como Jove da Mata, nasceu em Januário (MG), região do Alto Médio São Francisco (SOUTO, 2014).

Jove da Mata era fazendeiro da região da Mata do Engenho. Foi membro da Academia Municipalista de Letras de Belo Horizonte e da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais (AMULMIG), onde nessa última tomou posse em 11 de dezembro de 1968, passando a patrono da cadeira 41 (SOUTO, 2014).

Souto (2014) afirma que Jove da Mata é autor de poemas populares que retratam fatos históricos reais pessoais, da terra natal e do povo da região do São Francisco, como podemos ver no poema transcrito de Azevedo (1978), que foi produzido em 21 de maio de 1941.

ABC DE SÃO FRANCISCO
 
-A-
A justiça em São Francisco
Tem se tornado famosa,
Vulgarizou o seu nome
Numa baila vergonhosa,
Quer na roça ou na cidade
O seu nome está na prosa.
-B-
Basta dizer que o Fórum
Parece mais um covil
O juiz que o preside
Afeiçoou-se ao lôdo vil,
De ser baixo e turbulento
É este o seu perfil.
-C-
Com a nova constituinte
A coisa modificou,
O ministro da justiça
O direito reformou,
Em São Francisco, ao contrário
No ostracismo ficou.
[…]
-Z-
Zangue zangue quem zangar
Meu a bêcê escrevi
E canto com causa justa
As misérias que já vi
É o extrato da história
Da terra onde nasci ! …
 
Til é um acento gráfico
E com ele vou fundar
As misérias de São Francisco
Faz vergonha de contar
E se ofende a vosmecês
Por Deus queiram me desculpar.
(AZEVEDO, 1978, p.113-116)

Escrito na fazenda Mata do Engenho, resultante da decisão de tornar-se poeta no lugar de um criminoso.

Depois de muito ponderar e meditar as coisas, resolvi tornar-me poeta em vez de bandido e cantar a minha própria dor! Rogoberto Ferreira da Silva juiz de Direito de São Francisco, que homem horroroso! Acompadrou-se com o ditador da terra, homem que só conhece como Deus do céu e da terra dinheiro! Em nome da justiça, com seus processos mais ou menos cúpidos invadia as fazendas e vendia o gado e seu compadre. (N. do Autor)(AZEVEDO, 1978, p. 116)

Produções de Jove da Mata foram recolhidas por Saul Alves Martins, antropólogo, folclorista, professor da UFMG e membro da Comissão Mineira de FOLCLORE onde foi presidente de 1980-1983 (AZEVEDO, 1978).

Na sinopse da obra de Rodrigues Júnior (2012), intitulada Jove da Mata: identidade e memória na literatura popular sanfranciscana, podemos ler que o poeta versejava de forma única, recitando o rio São Francisco e a realidade regional (SINOPSE, [2012?]).

FONTES CONSULTADAS

AZEVEDO, Teófilo de. Literatura popular do norte de minas: a arte de fazer versos. São Paulo: Global, 1978. Cultura popular, nº 3.

SINOPSE. [S.l. : s.n.]. In: CLUBE de autores. [2012?]. Disponível: <https://www.clubedeautores.com.br/book/133109–JOVE_DA_MATA_IDENTIDADE_E_MEMORIA_NA_LITERATURA_POPULAR_SANFRANCISCANA#.WdrWK1tSzIU&gt;. Acesso em: 8 out. 2017.

SOUTO, Maria Generosa Ferreira (Org.). Escritores mineiros: poesia e ficção. Montes Claros: Clube de Autores, 2014.

Poeta José Pedro de Lima – Síntese biográfica

Índio é o pseudônimo do cordelista paraibano José Pedro de Lima, nascido em Dona Inês (PB) em 15 de maio de 1946. Homem simples, com expressiva produção cordelística para quem começou a versejar aos 60 anos, pois já escreveu mais de quatro centenas de folhetos. Foi o vencedor do Concurso Novos Escritos da Fundação Cultural de João Pessoa (FUNJOP), em 2007, na categoria literatura de cordel publicando Irineu: o terror de Mangabeira (CORDELISTA…, 2016; LIMA, V.1).

José Pedro é o segundo filho de Manoel Pedro Pereira e Severina Luiz de Lima, com quem aprendeu a ler, escrever e contar, pois só pôde frequentar a escola por poucos dias (CORDELISTA…, 2016).

Casado com Miriam de Lima, com quem tem seis filhos: Júnior, Felipe, Lucas, Eliomar, Emanuel e Socorro. Reside no litoral sul paraibano, em Barra de Gramame, ganhando a vida vendendo espetinhos de churrasco às margens do rio no limite entre João Pessoa e o Conde (LIMA, V.1).

Verseja, praticamente, sobre todos os temas do cordel. Um deles foi destaque em matéria publicada no jornal Correio da Paraíba por abordar formas de prevenção contra o vírus da Zika onde podemos ler os versos iniciais do folheto de 8 páginas, produção de número 327, intitulado Zika Zero:

Existem onze maneiras
Do tal Zika combater
Preste bastante atenção
É fácil de aprender
Nunca deixe água parada
Manter a caixa fechada
Assim podemos vencer
(CORDELISTA …, 2016).

Na mesma matéria jornalística, encontramos a informação de que José Pedro de Lima começou a escrever cordéis após uma reportagem local sobre a qualidade das vias de acesso à Barra de Gramame, e o poeta apresentou alguns de seus versos sobre a péssima situação das estradas. O repórter elogiou e aconselhou José Pedro a investir no seu dom. Estimulado pelas palavras de apoio, Índio procurou participar de oficinas de cordel e deu início à sua produção independente (CORDELISTA…, 2016).

Cordelista historiógrafo memorialista, narra fatos passados e contemporâneos, como seus cordéis autobiográficos e sobre a corrupção política. Eis os trechos de Minha História Contada em Verso 1, folheto nº 342:

Foi lá nos anos cinquenta
O mês eu não estou lembrado
Nessa época meu pai tava
Dois meses desempregado
Meu pai disse Severina
Andei em toda Campina
E não ganhei um cruzado
 
Era crise em todo Estado
E emprego nem pensar
Meu pai tinha profissão
Era um pedreiro exemplar
Que andava permanente
Nem uma vaga de servente
Conseguia encontrar
 
Era pra lá e pra cá
Andava o dia inteiro
Trabalhava em qualquer coisa
Para conseguir dinheiro
Andava igual besta tonta
Pra ver se pagava a conta
Que devia ao leiteiro
[…]

Cada pessoa traz em si uma coletividade, são suas memórias de grupo e experiências vividas. Assim José Pedro expressa sua sofrida história de vida, das dificuldades passadas quando residia em Campina Grande (PB), com apenas 7 anos, com seus pais  Manoel e Severina e mais quatro irmãos, e tiveram que migrar para Pombal (PB), onde residiram debaixo de uma ponte por quase um ano, como verseja em Minha História Contada em Verso 2.

Sofríamos de fazer dó
Naquele lugar friento
Embaixo daquela ponte
Expostos a chuva e ao vento
Confesso meu camarada
Que durante a madrugada
Pra nós era um sofrimento
[…]
 
Quase um ano
E nós no mesmo lugar
Foi aí que a minha mãe
Inventou de engravidar
Pra nossa felicidade
Pai aluga na cidade
Uma casa pra morar
[…]
 
Tudo foi se encaixando
No seu devido lugar
Seu Zé e pai trabalhando
Nada mais ia faltar
Só que para complicar
A mãe foi engravidar
Tudo voltou a piorar
[…]

O pai do poeta era exímio pedreiro e em Pombal/PB trabalhou na construção do cinema, como nos conta rimando, na página 2 do Minha História Contada em Verso 3, cordel nº 344:

[…]
O meu pai na obra era
Quase o encarregado
O dono ficava ali
Feliz e muito animado
E naquela correria
Em ritmo acelerado
 
Pai tinha o maior cuidado
Pra tudo ficar perfeito
O dono ali do seu lado
Ficava bem satisfeito
Enquanto ia o serviço
Era feito no capricho
Com qualidade e bem feito
 
Dessa maneira o cinema
Rápido era construído
O dono muito feliz
Em ver seu prédio erguido
Pra que adultos e crianças
Tivesse a esperança
De ter seu show garantido

Com a separação dos pais, a mãe decidiu migrar para o estado do Rio Grande do Norte onde José Pedro foi agricultor. Anos depois, trabalhou como armador na construção das pontes de Picuí e Trapiá. Com o término das obras, foi com a construtora para Campina Grande (PB) e após 23 anos reencontrou seu pai, como versou em Minha História Contada em Verso 4, cordel de número 345.

Bem que eu queria acabar
Mais ainda não dá não
A cidade de Pombal
Traz muita recordação
Da ponte que me hospedei
Do rio onde pesquei
Até piaba de mão
 
Ali vivemos um tempão
Até as coisas mudar
Quando mãe viu que a gente
Já podia trabalhar
Então não mediu distância
Juntou ali as crianças
Fomos pra outro lugar
 
Dessa vez fomos morar
Bem distante de Pombal
O Rio Grande do Norte
Pra nós foi o ideal
Logo que a gente chegou
Viramos agricultor
Pra nós foi muito legal
 
E foi na agricultura
Que a gente se criou
Foi onde aprendi tudo
Que faz o agricultor
Cortei lenha de machado
Capinei limpei roçado
Cortei terra e trator
[…]
 
Respondi pra ele tudo
Que possa imaginar
Sei limpar mato e roçado
Sei colher e sei plantar
Ele disse cidadão
Meu ramo é a construção
Tem coragem de enfrentar
[…]

Em conversa com José Pedro de Lima, ele refletiu que seu dom é divino e sua inspiração vem do cotidiano e suas memórias. Da ligação entre vida e memória presente nos seus versos biográficos memorialísticos, apreciamos rastros de sua vida e a construção de sua identidade.

FONTES CONSULTADAS

CORDELISTA José Pedro Lima se inspira no combate ao vírus da Zika. Correio da Paraíba Online, João Pessoa, 28 jun. 2016. Disponível em: <http://correiodaparaiba.com.br/cultura/musica/cordelista-jose-pedro-lima-se-inspira-no-combate-ao-virus-da-zika/&gt;. Acesso em: 14 out. 2017.

LIMA, José Pedro. Minha história contada em verso: cordel 1, nº 342. [Conde]: [S.n.], [21–].

LIMA, José Pedro. Minha história contada em verso: cordel 2, nº 343. [Conde]: [S.n.], [21–].

LIMA, José Pedro. Minha história contada em verso: cordel 3, nº 344. [Conde]: [S.n.], [21–].

LIMA, José Pedro. Minha história contada em verso: cordel 4, nº 345. [João Pessoa]: [S.n.], [21–].

Poeta José Anchieta Dantas Araujo – Síntese biográfica

O poeta, cordelista e humorista cearense, de Jati (CE), José Anchieta Dantas Araújo, para comemorar 13 anos de estrada na seara da poesia popular, publicou coletânea com dez dos seus sucessos em folhetos de cordel, intitulado Seu Lunga: o campeão do mau humor e outras histórias (2012). (POETA …, 2012).

José Anchieta ao participar do programa televisivo Nas Garras da Patrulha, na TV Diária em Fortaleza (CE), criou um personagem que deu origem ao seu pseudônimo – Zé do Jati (PAIO, 2013).

O desejo de dedicar-se à literatura surgiu em Zé do Jati, ainda na infância, e foi na literatura de cordel que realizou seu sonho. Em entrevista a Paio (2013), o cordelista contou:

Desde pequeno lia e escrevia bastante. Com 14 anos de idade eu já gostava de ler os poemas de Castro Alves. Desde essa época, eu tinha vontade de publicar meus pensamentos e percebi que no cordel podia fazer minhas críticas, mas sempre com humor.

Cordelista desde o ano de 1999, Zé do Jati aponta o silêncio e a tranquilidade noturnos como geradores do processo criativo, o que não impede os momentos de inspiração repentina, como relatou: “Já aconteceu de eu ter umas ideias durante minhas viagens e até quando estou dirigindo” (PAIO, 2013).

Aos 20 anos, quando foi residir em São Paulo (1976), Zé do Jati escreveu poemas e um ano depois de retornar às origens publicou seu primeiro livro – Nós e a Metrópole (1981) (PAIO, 2013).

José Anchieta aponta os poetas Manuel Bandeira, Vinicius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade e Fernando Pessoa como leituras prazerosas para seus estros poéticos (PAIO, 2013).

Este grande poeta popular mostra toda a sua irreverência no cordel Seu Lunga, o campeão do mau humor, cujas estrofes são transcritas.

A vida tem regras claras
E quem quiser viver bem
Nunca a um amigo conta
Algum segredo que tem
Pois pra não correr perigo
É bom saber que o amigo
Tem outro amigo também
 
Seu Lunga tava gripado
Lhe deram limão com mel
Três doses de aguardente
Um chá amargo igual fel
Lunga dormiu de repente
Quando acordou sorridente
Disse: - Eu estive no céu.
 
Mas só para a mulher
Essa estória contou
Ordenou: - guarde segredo
Ela jura que guardou
Mas, isso virou futrica
E em casa ninguém explica
como a estória vazou
 
Pois logo no mesmo dia
A vizinha cochichava
Sobre o sonho de Lunga
A amiga que passava
E de cochicho em cochicho
"Igualsin" fogo no lixo
A estória se espalhava
 
Contaram o sonho no Crato
E depois lá em Sobral
Em São João da Perna Fina
E Riacho Marechal
De boca em boca contando
A estória se espalhando
Chegou lá em Bacabal
 
Um caminhoneiro ouviu
Contou lá em Laço Froxo
Se espalhou por Londrina
Por Várzea de Sete-Coxo
Depois contaram em Salgueiro
No Icó e Limoeiro
E em São Miguel do Pau-Roxo
 
[...]
 
(ARAÚJO, 2008)

FONTES CONSULTADAS

ARAÚJO, José Anchieta Dantas. O segredo de seu Lunga: campeão do mau humor. Fortaleza: [s.n.], 2008. V. 5, 18 p.

PAIO, Ícaro. Conheça a história de vida do cordelista José Anchieta Dantas Araújo, assistido da FAELCE. [S.l. : s.n.]. In: FAELCE. 5 jul. 2013. Disponível em: <http://www.faelce.com.br/site2013/?tp=nt&cod=636&gt;. Acesso em: 23 ago. 2017.

POETA reúne cordéis em livros. [S.l. : s.n.]. In: Diário do Nordeste. 6 out. 2012. Disponível em: <http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/regional/poeta-reune-cordeis-em-livro-1.643921&gt;. Acesso em: 23 ago. 2017.

ZÉ DO JATI lança coletânea de cordéis em livro. [S.l. : s.n.]. In: Diário do Nordeste. 9 out. 2012. Disponível em: <http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/ze-do-jati-lanca-coletanea-de-cordeis-em-livro-1.647230&gt;. Acesso em: 23 ago. 2017.

Poeta João Siqueira de Amorim – Síntese biográfica

O poeta cantador João Siqueira de Amorim nasceu em Barbalha (CE) em 16 de junho de 1913 e faleceu aos 82 anos, no dia 16 de novembro de 1995.  O esposo de Dona Raimundinha era filho de pais humildes e não teve acesso à educação formal, mas ouvindo o repentista alagoano Zé Félix, ainda criança, decidiu ser cantador (PAULINO, 2011; VIEIRA, 2013a; VIEIRA, 2013b).

Vieira (2013b) conta que o repentista dedicou-se ao cordel após perder a voz por problemas na laringe, consequência de uma cirurgia para retirada de uma espinha de peixe, mas Viana (2011) diz que o cantador “[…] perdeu a voz após uma exaustiva maratona de apresentações Nordeste afora”. Ambos mencionam várias homenagens feitas para Siqueira, de poemas historiando o incidente à canção intitulada Voz do Siqueira, de Alberto Porfírio.

Fundou o jornalzinho A Voz do Cantador (Fortaleza, 1956), veículo de comunicação da Associação dos Cantadores do Nordeste, com primeiro número datado de 1 de janeiro de 1956 (PAULINO, 2011).

Paulino (2011) relata que Siqueira não se deixou vencer, apesar da tristeza pelo incidente sofrido, e por meio de sua verve poética assim se expressou:

Passarinho lavandeira,
Canta e diz para a cidade
Que a viola do Siqueira
Emudeceu de saudade!...
 
Qual a razão, quais os males
Que fiz aos meus semelhantes
Para perder minha voz
No curso de alguns instantes?
Às vezes, sonho cantando,
Mas é o sonho enganando
As minhas cordas vocais;
De alegria me transbordo,
Porém depois quando acordo
Tudo é mudez… nada mais.
 
Quanta tristeza me invade
Quando a manhã vem raiando:
Eu ouço o concerto alegre
Da passarada cantando…
Acordes da melodia
Trazem aquela alegria
Da aurora que surge além,
Enquanto eu, mudo, enlutado,
Me lembro que no passado
Já fui cantador também.
 
Em certas horas soluço
Qual um órfão pela rua;
Chora comigo a saudade
Nas noites claras de lua…
Meus tempos de cantorias,
Meus “quadrões”, minhas porfias,
No litoral, nos sertões.
O sabiá sem gaiola
Perdeu a voz, a viola,
O sonho, a rima, as canções…
 
Nesses momentos divinos
Sob estranhos pesadelos,
Chegam-me versos e rimas,
Mas eu não posso dizê-los:
Minha viola querida
Lá num canto emudecida,
Como quem tudo perdeu.
Quero cantar, como outrora,
Procuro a voz, foi embora,
Minhalma também morreu!...

O extraordinário cantador Siqueira de Amorim começou a cantar em 1928. Na trajetória, fez dupla com o violeiro Domingos Fonseca e outros repentistas, como Rogaciano Leite, Cego Aderaldo e Granjeiro. Foi funcionário público e jornalista, tendo chegado a Fortaleza (CE) no ano de 1935, passando a contribuir nos jornais Gazeta de Notícias, O Povo, O Estado e Correio do Ceará; neste último, manteve a secção Poesia Popular. Foi sócio efetivo da Associação Cearense de Imprensa (ACI) desde 1950 (PAULINO, 2011; VIEIRA, 2013b).

Vieira (2013b; 2013a) conta que entrevistou Siqueira para o programa Canto Sertanejo da Rádio Pitaguary, na década de 90. Nesse momento, expressou manter sua existência ao rimar cordéis, além de divulgar possuir material inédito para publicação, e apesar de não possuir condições financeiras, nem apoio de instituições culturais, tinha esperança de vir a lançar. Vieira (2013a) conta que alguns anos após o falecimento de Siqueira, “os originais guardados em ambiente insalubre, na velha residência, foram destruídos”.

O autor de Ecos da Juventude (1949) publicou cordéis, como Os Estrupícios da Cachaça (1986).  (VIEIRA, 2013b)

Depois de falar um pouco
Da vida do macumbeiro,
Palavra que representa
O mesmo catimbozeiro,
Vou tirar algumas lapas
Do couro do cachaceiro.
 
Vejam bem, caros leitores,
O que é que a cachaça faz:
Desce queimando a garganta
Numa fusão de água e gás,
Depois sobe pra cabeça
Transformando em satanás!
 
O viciado em bebidas
Sempre dela se socorre,
Para o calor, para o frio,
Toma todo dia um porre,
Só vive matando o “bicho”
E esse bicho nunca morre...
(AMORIM, 1986)

Vieira (2013a) lançou Nos caminhos da Vida de Siqueira de Amorim, reprodução das crônicas de Siqueira publicadas em jornais de Fortaleza, entre as décadas de 40 e 60. O pesquisador assim descreve o cantador cordelista: “[…] não foi somente um poeta repentista ao som da viola, mas um formador de opinião, admirado por colegas do repente e intelectuais. Compunha a elite de cantadores de sua época […]”.

FONTES CONSULTADAS

AMORIM, Siqueira de. Os estrupícios da cachaça. [s.n.]: Ceres, 1986. 8 p.

VIANA, Arievaldo. Alberto Porfírio: um mestre da poesia popular. [S.l. : s.n.]. In: Acorda Cordel. 22 jun. 2011. Disponível em: <http://acordacordel.blogspot.com.br/2011/06/alberto-porfirio_22.html&gt;. Acesso em: 30 ago. 2017.

VIEIRA, Guaipuan. Livro narra história de Siqueira de Amorim. [S.l. : s.n.]. In: Academia Municipalista de Letras do Estado do Ceará (AMLECE). 24 maio 2013a. Disponível em: <http://amlece.blogspot.com.br/&gt;. Acesso em 30 ago. 2017.

VIEIRA, Guaipuan. Siqueira de Amorim. [S.l. : s.n.]. In: Centro Cultural de Cordelistas do Nordeste (CECORDEL). 25 jan. 2013b. Disponível em: <http://cecordel.blogspot.com.br/2013/01/siqueira-de-amorim-por-guaipuan-vieira.html&gt;. Acesso em: 30 ago. 2017.

PAULINO, Pedro Paulo. Lamento de um cantador. Canindé: [s.n.]. In: Vila Campos Online. 8 jul. 2011. Disponível em: <http://vilacamposonline.blogspot.com.br/2011/07/poesia.html&gt;. Acesso em: 01 set. 2017

Poeta João Rodrigues Amaro – Síntese biográfica

Apontado como uma dos grandes cordelistas pela Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), João Rodrigues Amaro, mais conhecido como João Amaro, adotava os pseudônimos de Jotamaro e Mr. Karyakyni (AMARO, 1982).

Segundo informações contidas em texto reproduzido no blog Soldados da Borracha: denúncia, João Rodrigues Amaro é autor do livro Retalhos da Minha Vida e Poesias Populares, onde narra toda dificuldade sofrida na floresta amazônica quando foi recrutado para o exército da borracha.

O cordelista de Sobral, João Amaro, 68, puxou, sem querer, a ponta de um novelo. No começo, o assunto nem era esse. O aposentado mostrava material, dezenas de folhetos de cordéis de sua autoria, para uma matéria sobre os versos fesceninos, veiculada pelo suplemento Sábado.No decorrer da entrevista, no entanto, uma surpresa: a vida de João Amaro se confundia com a de 55 mil nordestinos que formaram, durante a II Guerra Mundial, o Exército da Borracha. (SAGA …, 2014, destaque nosso)

Sabendo que o Ceará foi o centro do recrutamento e transporte dos nordestinos para os seringais, isso reforça a possibilidade de tratar-se do cordelista Jotamaro, que era cearense. Com relação à sua naturalidade, há diferentes fontes com diversificada informação. Na contracapa do folheto As Preces da Velha Vitalina, publicado em 1982, consta que Jotamaro é concidadão de Guajará Cialdini, natural de Sobral, a Princesa do Norte. Na página 52 da tese de Francinete Fernandes de Sousa (2009), consta a informação que João Amaro (Jotamaro) nasceu e morreu em Fortaleza (CE) 1926-1993 (AMARO, 1982; SOUSA, 2009).

As Preces de uma Velha Vitalina
 
Caro amigo Guajará
Certo dia fui passando
Defronte a uma igreja
Vi uma velha rezando
E entrei sem ela vê
De perto fiquei brexando
 
Talvez uns 60 anos
Eu acho que a velha tinha
Sua venta era bicuda
Modo o bico da galinha
Estava usando um colan
E uma saia curtinha
(AMARO, 1982)

O cordel O Babão, com 8 páginas e 38 estrofes em sextilha, na primeira página podemos ler:

Meu caro e amigo leitor
eu vou falar de um ente
cujo dito eu considero
pior do que uma serpente
pois só vive neste mundo
para fazer mal a gente.
 
O que induz a mim
a fazer este livrinho
é a raiva que eu tenho
deste sujeito mesquinho
que temos como um amigo
e o tratamos com carinho.
 
Mas ele não corresponde
e trai a nossa amizade
pois é um cabra safado
que vive só de maldade
e só se sente feliz
cometendo falsidade
 
Eu estou me referindo
ao indivíduo babão
o sujeito caboeta
bajulador de patrão
um cretino que só paga
o bem com a ingratidão.
 
(AMARO …, 2013; AMARO; [s;d;])

FONTES CONSULTADAS

AMARO, João. As preces de uma velha vitalina. Fortaleza: [s.n.], 1982. In: Cordelteca. Disponível em: <http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=cordel&pagfis=64616 >. Acesso em: 7 set. 2017.

AMARO, João. O babão. [S.l. : s.n.], [s.d.].

MESTRES do Cordel. [S.l. : s.n.]. In: CECORDEL. 6 jan. 2013. Disponível em: <http://cecordel.blogspot.com.br/2013/01/os-mestres-do-cordel-serie-os-mestres.html&gt;. Acesso em 8 set. 2017.

SAGA dos Arigós: história dos Soldados da Borracha. [S.l. : s.n.]. In: Soldados da borracha: denúncia. 24 jan. 2014. Disponível em: <http://soldadodaborrachadenuncia.blogspot.com.br/2014/01/a-saga-dos-arigos-historia-dos-soldados.html&gt;.  Acesso em: 7 set. 2017.

SOUSA, Francinete Fernandes de. A mulher negra mapeada: trajeto do imaginário popular nos folhetos de cordel. 2009. 254 f. Tese (Doutorado em Letras)- Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2009.