A cearense Maria de Lourdes Aragão Catunda, mais conhecida como Dalinha Catunda, filha de Espedito Catunda de Pinho e Maria Neuza Catunda, é uma cordelista, declamadora e contadora de histórias. Traz no sangue o dom artístico, pois a mãe era poetisa e a tia contadora de histórias. Natural de Ipueiras (CE), nasceu no dia 28 de outubro de 1952 e radicou-se, ainda jovem, no Rio de Janeiro (MAGALHÃES, [21–]; OLIVEIRA; SOARES, 2016).
Desde cedo aprendeu a transformar sentimentos em versos e prosas, e ao produzir trabalhos de reconhecido valor literário cultural, Dalinha Catunda conquistou espaço hegemonicamente masculino da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), ocupando a cadeira 25 cujo patrono é Juvenal Galeno. Também é membro da Academia Ipuense de Letras, Ciência e Artes (AILCA) e sócia benemérita da Academia dos Cordelistas do Crato (ACC) (MAGALHÃES, [21–]; OLIVEIRA; SOARES, 2016).
No blog Cordel de Saia, Dalinha propôs o mote: Se tem mulher no cordel/Você tem que respeitar. E na primeira estrofe, versou:
MULHER NO CORDEL O homem é mestre no verso E a mulher nunca se acanha Rodando a saia com manha Ingressa nesse universo Encara tema diverso Na cultura popular, Ocupando seu lugar E faz bem o seu papel Se tem mulher no cordel Você tem que respeitar. (CATUNDA et. al., 2012)
Segundo Magalhães ([21–]), Dalinha planejou e fundou o grupo Flor do Cariri, no Crato (CE), e assim ressignificou a contação de história e cantigas de roda, traços da sua infância e formadores de sua identidade nordestina.
Por meio de sua verve poética, apresenta autorrelato de suas origens, unindo sua vida à sua inserção histórica e sociocultural. A poesia biográfica de um tempo vivido fortalece a identidade. Vamos apreciar os poemas Filha do Nordeste e Nordestina, sim senhor! e descobrirmos um pouco dessa poetisa popular.
Filha do Nordeste Sou Dalinha, sou da lida. Sou cria do meu Sertão. Devota de São Francisco E de Padre Cícero Romão. Sou rês da Macambira, Difícil de ir ao chão. Sou o brotar das caatingas, Quando chove no sertão. Sou cacimba de água doce, Jorrando em pleno verão. Sou o sol quente do agreste. Sou o luar do sertão. Minha árvore é mandacaru. Meu peixe, curimatã. Eu tomo com tapioca, O meu café da manhã. Sou uma bichinha da peste, Meu ídolo é Lampião. Sou filha das Ipueiras. Sou de forró e baião. Sou rapadura docinha, Mas mole eu não sou não. Sou abelha que faz mel, Sem esquecer o ferrão. E se alguém realmente, Inda perguntar quem sou, Digo sem medo de errar: Sertaneja, Sim Senhor! Nordestina, sim senhor! Eu sou nordestina Me orgulho de ser Sou do Ceará Com muito prazer Não faço suspense Sou ipueirense Pra quem quer saber. Se escuto a sanfona Perfumo o cangote Dançando faceira Aguento o pinote Pois sou dançadeira Levanto a poeira Capricho no xote. Eu danço São João Eu pulo fogueira Faço simpatia A da bananeira Me visto de chita Com laço de fita Desfilo faceira. Eu como cuscuz Paçoca e baião Como tapioca E bife do oião Eu como buchada Também malassada Sem indigestão. Na rede me deito Pra me balançar E nesse balanço Preciso contar Cumprindo o destino Eu já fiz menino Sem punhos quebrar. Eu sou ribaçã Sou ave migrante Sou rio que corre Que segue adiante Eu sou empolgada Comigo só nada É quem se garante. Eu sou mesmo agreste Meu nome é Dalinha Não fujo de embate Não fujo da rinha Se você empaca Não puxe sua faca Deixe na bainha.
Dalinha passou a escrever cordéis quando começou a residir no Rio de Janeiro, como forma salvaguardar sua identidade nordestina, como afirmou em entrevista: “O cordel propriamente dito, eu só comecei a fazer aqui no Rio e passei também a escrever mais, por conta da saudade que eu sentia do mundo que deixei para trás”. Tal afirmação demonstra sua paixão pela cultura popular e sua origem, por isso trabalha para manter viva a cultura cordelística.
Antes de concluir, não podemos deixar de apresentar como a cordelista Dalinha é vista pelos olhos da parceira de produção poética Maria do Rosário Pinto:
[…] Sua temática é sempre corajosa, carregada de humor e com rimas impecáveis. Sua criatividade/atividade é intensa, explode ao menor sinal. Basta cutucá-la com um tema qualquer, que logo começa um novo poema. […] nos mostra o que mais a caracteriza poeticamente – versatilidade na criação temática, na arte da composição, da rima e da estruturação das orações. (CATUNDA, 2010)
Eternizada no folheto de Josenir Amorim Alves de Lacerda, Dalinha Catunda: a abelha do sertão.
Vieram me pergunta quem é mesmo essa Dalinha que tão faceira caminha sem no verso tropeçar que sabe tão bem falar com carinho e precisão das belezas do sertão empolgada e sem preguiça nossa saudade ela atiça no forno do coração. Essa "cabôca" sem par responde sem ter receio é daqui do nosso meio digo sem medo de errar da cultura popular é ferrenha protetora é mestre e divulgadora enaltece o seu valor com zelo e com destemor do cordel é defensora […] (LACERDA, 2011)
Com sua literatura de cordel, Dalinha já versou com vários poetas populares, como Dideus Sales, Francisco Itaerço, Fred Monteiro, Josenir Lacerda, Luiz de Assis Monteiro, Marco Di Aurélio e Rosário Pinto.
FONTES CONSULTADAS
CATUNDA et. al. Mulher no cordel I. [S.l. : s.n.] In: Cordel de saia. 27 set. 2012. Disponível em: <http://cordeldesaia.blogspot.com.br/2012/09/mulher-no-cordel.html>. Acesso em: 23 out. 2017.
CATUNDA, Dalinha. Cobra criada. Rio de Janeiro: ABLC, 2010.
LACERDA, Josenir. Dalinha Catunda: a abelha do sertão. Crato: Academia dos Cordéis de Crato, 2011.
MAGALHÃES, Elton Linton O. Personalidades. [S.l. :s.n.]. In: Cordel na web. [21–]. Disponível em: <https://ocordelnaweb.wordpress.com/entrevistas-2/>. Acesso em: 22 out. 2017.
OLIVEIRA, Ana Aparecida Alves Pereira; SOARES, Maria Clara Pereira. Cordelistas no processo migratório: a expressão da experiência feminina e nordestina. Ponto e Vírgula, São Paulo, v. 20, p. 83-103, segundo semestre 2016.